quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Conteúdo > A História bem na Foto - 6

Neste A História bem na Foto - 6:
Pedro Agilson > A chacina de Vigário Geral
Delfim Vieira > Seca no Ceará
Evandro Teixeira > Vinicius, Tom e Chico
Claudio Versiani > Taffarel e Baggio
Alex Ferro > Carnaval de Rua


Este blog segue o padrão “livri”, ou seja, tem número limitado de postagens
e é editado para leitura de cima para baixo.
Outros blogs complementares, à medida da necessidade de espaço, poderão ser editados.
Foto do título: Bandeiroso, Aguinaldo Ramos, 2001.
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A História bem na Foto - 3
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Pedro Agilson > A chacina de Vigário Geral


Não tenho a pretensão de ter feito alguma foto histórica. O que será filtrado pela História nessa massa que produzimos?
Acho essa foto bem representativa de certo momento do trauma carioca e que ainda se agravou mais com o passar do tempo. A chacina de Vigário Geral. Saiu ao lado do editorial da IstoÉ na semana do fato, do Mino Carta.





Na verdade, não é a foto publicada, é uma das “sobras”. É complicado uma garimpagem nos arquivos das editoras... Enfim, essa é mal resolvida, mas passa o essencial, a vira-lata abrindo o cortejo.
Foi um dia tão forte que me surpreendi ao ver a foto publicada. Não tinha consciência que a tinha feito.


PedroAgilson > 58 anos, paulista (só de nascimento).
Comecei como fotojornalista em 72 por uma maluquice do Luis Humberto, no Jornal de Brasília, que decretou, como diretor de arte, que os diagramadores deveriam fotografar para sentir o drama dos fotógrafos. Já tinha uns cursos de fotografia na Universidade de Brasília e acabei tomando gosto pela coisa.
No Rio, free-lancer, agência, até ficar na IstoÉ por um bom tempo. Somando, uns 30 anos de fotojornalismo.
Hoje sou artista plástico e web-designer.

Delfim Vieira > Seca no Ceará

Texto, fornecido pelo fotógrafo, originalmente preparado para acompanhar a foto na inscrição no Prêmio Esso de 1983 (o que não chegou a ser feito):

Estas são fotos do período 17 a 26 de agosto de 1983, em que tentei, com o repórter Egídio Serpa, retratar a seca do Nordeste para o Jornal do Brasil. O conjunto e cada uma delas revelam a realidade de milhões de brasileiros após cinco anos consecutivos sem chuvas.
Logo à chegada ao Ceará, dirigi-me ao interior, aos chamados bolsões da seca. Não foi preciso andar muito para me deparar com cenas inesquecíveis, principalmente para quem vive no “sul-maravilha” (como diria o Henfil). A primeira, foi uma leva de homens famintos atravessando um grande açude, absolutamente seco, em direção ao povoado conhecido, ironicamente, como Lagoa do Juvenal. Iam receber os Cr$15 mil prometidos na frente de trabalho. Não conseguiram, e, nesse dia, quatro cidades foram invadidas e saqueadas.
Mas, eu ainda tinha visto pouco, quase nada. Dia seguinte, encontramos em Irauçaba, a somente 150 quilômetros do luxuoso hotel onde estava hospedado em Fortaleza, uma família que se alimentava de ratos-do-mato (punaré) há três anos. No primeiro momento, o Egídio pensou tratar-se do peixe tucunaré, mesmo sendo algo impossível naquele lugar. Era rato mesmo, semelhante às ratazanas daqui.
Novamente instalado em meu quarto de hotel, deprimido e sem conseguir dormir, vi pela televisão o prefeito de Apuiarés tentando sensibilizar o Governo para a gravidade da situação do município. Lá, dizia, estavam comendo calangos (lagartixas) para sobreviver. Se eu estivesse aqui, provavelmente reagiria com descrédito. Seria possível? Exagero?



Não era. Encontramos no dia 22 um homem muito enrugado e muito magro, que nos mostrou o produto de um dia de caça: um calango morto com atiradeira, pronto para virar torresmo e ser comido em pedacinhos, com farinha, por toda uma família. Essa foto deu origem a duas charges (uma de Ziraldo, outra de Chico Caruso), além de provocar uma discussão no Congresso Nacional entre senadores do PDS e PMDB – “é válido mostrar algo tão brutal?” – discordavam. Tenho certeza que sim.
“O Francisquinho eu tô quase certa que vai morrer, e este aqui, na barriga, vai pelo mesmo caminho”. Acho que, em toda minha vida, não vou jamais esquecer aquela mulher grávida, rodeada de crianças com olhos saltados pela desnutrição, dizendo esperar pela morte dos filhos. E eu também era expectador, só que sem entender como a fome e o desespero podiam transformar-se e traduzir-se em conformadas palavras. Fiz a foto, no mesmo instante em que desejava ser chamado de volta ao Rio pelo jornal. Era terrível pensar que, se ficasse ali uns dois meses, conseguiria fotografar o nascimento de uma criança e, com certeza, sua morte menos até de dois meses depois – como informavam os atestados de nascimento e óbitos do cartório de Ideal.
A última foto foi feita no caminho para o Aeroporto de Fortaleza. À certeza e gratificação profissional da tarefa realizada, misturavam-se alívio, sentimentos de culpa e de impotência por voltar ao Rio, deixando aquilo tudo para trás. Foi então que vi aquela multidão de homens, mulheres e crianças maltrapilhos. A capital, até aquele instante acompanhando a seca somente através de relatórios e entrevistas dos prefeitos do interior, estava sendo invadida silenciosamente.
Do sertão tinham vindo aquelas centenas de pessoas em busca de algo para comer e beber. Não foi preciso pedirem. Sua chegada teve imediata reação de comerciantes amendrontados, temerosos de saques; rápida e prontamente, começaram a distribuir alimentos em frente às escadarias da catedral de Fortaleza. Quando parti, aquela gente devia estar comendo pela primeira vez em muitos dias, sei lá quantos.




Delfim Vieira > Começou no Jornal do Brasil, onde estagiava pelo curso de Administração de Empresas, como laboratorista, para em seguida se tornar fotógrafo, em 1978. Trabalhou no JB até 1986, de onde se demitiu durante a cobertura da Copa do Mundo do México.
Foi para O Globo, tendo chegado à função de Coordenador da Fotografia.
Em 1993, transferiu-se para a sucursal carioca de O Estado de São Paulo, chefiando o setor de Fotografia até 2001.
Aposentado em 2000, foi free-lancer por uns tempos, mas atualmente é funcionário da Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos, RJ.

Evandro Teixeira > Vinicius, Tom e Chico

Transcrição de depoimento (editado), gravado durante debate sobre Foto-jornalismo, no “Encontros no Sub-solo”, da Livraria Leonardo da Vinci, Rio de Janeiro, 27/06/2007:


A foto do Chico, Tom e Vinicius, porque...
Historicamente, acho que é uma foto importante pela história dos personagens, pelo momento... Acho que aquele, como diria o Cartier-Bresson, foi um momento inusitado. (...) Era o aniversário do Vinicius de Moraes, na Carreta, uma churrascaria lá, de intelectuais, de Ipanema e tal...
Eu fui fazer uma matéria para o Caderno B, como eu era amigo deles, e chegando lá... E o Caderno B tinha o deadline... E o pessoal estava lá desde o meio-dia, tomando cana, Chico, Vinicius, Tom... Ficamos lá, e eu não bebo, e ficamos lá... E o Vinicius de Moraes era casado, naquela época, com uma argentina, Marquita, que era uma menina linda, novinha, tinha 22 anos, linda, linda... Uma morena linda, argentina...
E ficava o tempo todo abraçando a Marquita e beijando, e bebendo, e cantando... E o Tom no violão, e o Chico, e tal... E eu estou clicando, fiz três, quatro filmes, sei lá... E quando eu estava vendo o relógio, eu falei: “Ô Vinicius, pelo amor de Deus, ô Vinicius!... Eu já fiz até agora, operei aqui, acho que três, quatro filmes, sei lá, mas todos os cliques iguais!... E eu tenho que fazer uma coisa diferente!... O Caderno B... Eu vim aqui fazer uma matéria para o B, e o B é uma página gráfica, são duas páginas...”
De repente, naquele rompante (eu levei um susto!), Vinicius pegou o Chico e o Tom: “então vamos fazer uma foto diferente!”
De repente, no fundo da Carreta tinha uma mesa... Deita o Vinicius, o Tom e Chico... E o Vinicius, num “pau” arretado... Mas, tava num “pau”, cara, tava lá... E eu, nervoso, aquela coisa inusitada ali, como é que eu vou fazer?... Eu gritei para o Teixeirinha: “Teixeirinha, me traz uma coisa aí para eu subir, porra!”, e tal... Fiquei nervoso, como é que eu ia fazer a foto deles lá na mesa?... Aí o Teixeirinha trouxe um tamborete. Eu, na correria, naquele nervosismo, subi no desgraçado, nervoso, o tamborete, fiz um clique. Aí, caí eu, caiu o tamborete, caiu todo mundo... E eu só fiz esse fotograma, né?... Foi o que salvou...




E a máquina enguiçou, porque eu segurei a câmera, mas, com o tombo no chão, segurei na mão, e aí prendeu o obturador. E não bati mais nada, "deixa isso pra lá, não quero saber de foto, mais porra nenhuma"...
Voltei para o jornal nervoso. E o Alberto Ferreira, que foi um dos maiores editores do Brasil: “cadê a foto?”... Eu disse: “eu acho que eu fiz...”. Eu nunca disse que eu fiz... Não, vamos revelar primeiro...
Aí, tinha aquela foto belíssima... Aí, o Alberto Ferreira ampliou 30x40, saiu gritando pela redação, o Alberto Ferreira era uma figura maravilhosa... Aí, ele saiu com aquela foto. As outras para o Caderno B, e aquela para a primeira página.



Transcrição de fala de Evandro Teixeira no filme “Evandro Teixeira, instantâneos da realidade” (37’):


E essa foto ficou na História. É uma das fotos mais publicadas, aí na imprensa, e nos livros, e nos jornais do Brasil. Qualquer livro de História da Música Popular, ou do Chico, ou do Vinicios, ela é publicada, é requisitada, é mostrada...


Evandro Teixeira > nascido na Bahia, começou a sua carreira de fotógrafo em 1958, no jornal Diário da Noite, no Rio. Em 1963, ingressou no Jornal do Brasil, onde está até hoje, cobrindo os principais episódios políticos, sociais e esportivos do país e eventos mercantes do cenário mundial.
Expôs em importantes cidades do mundo e suas fotos fazem parte dos acervos do Museu de Arte Moderna do Rio, Masp e Museu de Arte Contemporânea de São Paulo, Museu de Belas Artes de Zurique, Suíça e Museu de Arte Moderna La Tertulia, Cáli, Colômbia.. Seu nome e currículo estão na Enciclopédia Internacional de Fotógrafos, onde estão reunidos os maiores nomes da fotografia no período de 1839 até os dias de hoje.
Recebeu, entre outros, os prêmios Sociedade lnteramericana de Imprensa (1969), e dos concursos internacionais da Nikon (Japão, 1975 e 1991) e da UNESCO (1993).
Publicou os livros "Evandro Teixeira - Fotojornalismo" (1982), "Canudos 100 Anos" (1997) e “Tributo a Neruda” (2005).

Claudio Versiani > Taffarel e Baggio



Em março de 1994, o diretor de redação do Correio Braziliense, Ricardo Noblat, me convidou para ser o editor de fotografia do jornal. Eu me considerava um fotógrafo de revista, mas o desafio de trabalhar em um jornal diário era interessante por vários motivos. Até então o jornal era muito ligado ao Governo do Distrito Federal e os donos do Correio Braziliense queriam transformá-lo em um veículo respeitável. Outro motivo era o próprio Noblat, jornalista de texto com passagens pela Revista Manchete, Veja, Jornal do Brasil e Istoé, onde trabalhamos juntos. Noblat sempre soube valorizar a imagem, mesmo porque aprendeu cedo que para publicar (bem) seus textos, precisava de boas imagens.
Quando a seleção brasileira de futebol embarcou para os EUA, eu fui também. A minha praia era o Esplanada dos Ministérios, o Congresso Nacional e o Palácio do Planalto. O Brasil treinava duas vezes por dia, eu treinava junto. Futebol, eu havia feito no começo da minha carreira em 1978, no Globo, em Belo Horizonte. Fotografia para mim significava trabalhar com flash. Fiquei impressionado como os colegas do Rio e São Paulo manuseavam as câmeras, que naquela época já tinham o recurso do auto-foco incorporado. Eu ainda preferia o foco manual. Tentei aprender com eles, mas desisti no meio do caminho. Estava ficando confuso operando foco manual e foco automático ao mesmo tempo. Voltei para o velho, bom e confiável foco manual. As primeiras digitais Kodak/Nikon e Kodak/Canon já estavam em campo, mas eram pesadas, lentas e geravam um arquivo não muito grande. Eu trabalhava com duas Nikon F4 e básicamente com uma 300mm f:2.8 e uma 500mm f :4. Como disse, cada treino era um aprendizado. Era um pela manhã e outro na parte da tarde. Pela diferença do fuso horário (4 horas), as fotos do treino da tarde só iam para as páginas se algo importante acontecesse. No Correio Braziliense era assim.
Estamos falando de 13 anos atrás... O treino acabava lá pelas 17 h. Ainda tinha que revelar o filme, escanear e transmitir as fotos, já eram 23h no Brasil. A adrenalina corria solta.
Treino é treino e jogo é jogo, disse o mestre Didi. O colete de identificação de fotógrafo credenciado só me permitia ficar de um lado do campo, ou seja, 45 minutos para tentar fazer a foto do jogo e torcer para o Romário fazer o seu golzinho do meu lado. Nem sempre foi assim, claro. Trabalhei em equipe com o Estado de Minas, com o companheiro Alberto Escalda. Fizemos um laboratório móvel e revelávamos nossos últimos filmes no porta-malas de uma van. Inventamos uma gambiarra e secávamos os filmes no sistema de aquecimento do carro. Os outros filmes eram recolhidos durante a partida pela Fuji e revelados gratuitamente. Isso funcionou no começo, mas o Brasil foi avançando e o número de fotógrafos cobrindo a seleção brasileira aumentava a cada partida. O laboratório da Fuji ficou atolado.
Contratei o serviço pago de revelação da Reuters. O esquema era o mesmo, eles iam recolhendo os filmes durante a partida. Isso baixou um pouco o nível da minha ansiedade e ganhamos tempo.
O resto todo mundo sabe, o Brasil chegou na final, graças aos golzinhos e golaços de Romário. Bebeto também comparecia.
17 de julho de 1994. Não deu para dormir na noite anterior, muita adrenalina e muita ansiedade. A partida estava marcada para 12h, chegamos no estádio às 6h30 e já tinha fotógrafo na fila para entrar no centro de imprensa. A adrenalina não parava de subir. Fotógrafos brasileiros e italianos tinham prioridade para entrar no campo, depois os das grandes agências e os norte-americanos e por fim os outros. Fiquei na linha de fundo, entre o gol e a bandeira do escanteio. Os fotógrafos disputavam centímetros, todo mundo fotografava ombro a ombro. 45 minutos pra lá, nada de gol. 45 minutos pra cá e nada de Romário. Prorrogação, e nada mudou. Disputa de pênaltis, o que fazer e para onde ir? O juiz decide que a decisão vai ser do meu lado. Fico quieto e não saio do meu lugar. Não me arrisco a disputar uma nova posição nas laterais do campo com os fotógrafos que vêm do outro lado.
Márcio Santos perde o pênalti, Baresi também. Ai, que agonia, o coração de fotógrafo e de brasileiro saindo pela boca, de verdade. Tudo empatado e lá vem o Baggio. Um chutão para fora e o Brasil é tetra campeão mundial de futebol.
O italiano fica prostrado, não se mexe. Taffarel dá alguns passos para frente, se ajoelha e joga os braços para cima, os dois dedos indicadores apontando para o céu. Só deu tempo de virar a máquina para a posição vertical e fazer 3 fotogramas, acho.

O campo vira uma loucura. Os jogadores reservas e a comissão técnica do Brasil entram em campo e todos se abraçam. A polícia americana isola os brasileiros com uma corda. O capitão Dunga segura a taça e comanda a volta olímpica. Essa foto é fácil de fazer, foco e exposição em cima. Cadê o cara da Reuters que não aparece para recolher meus filmes?
Será que a foto do Taffarel está no foco? Quase dois meses trabalhando todos os dias, de dia e de noite. E agora acabou. A Reuters já está revelando os últimos filmes.
Não há nada mais para se fazer no campo. Vou para o centro de imprensa e corro para conferir o foco do Taffarel, está perfeito. Deve ter sido sorte de principiante em Copa do Mundo.
A foto é um belo retrato do jogo. Um resumo fotográfico que conta a história da final da Copa de 94, com os dois personagens principais e a torcida comemorando no fundo.
Fiquei feliz em ter conseguido fazer a foto. Afinal foi a Copa em que o Brasil colocou a quarta estrela no peito. História pura.
O Correio Braziliense usou a foto do Dunga na capa do jornal e o caderno de esportes deu o Taffarel ocupando toda a capa. A primeira Copa do Mundo, ninguém esquece.


Trabalhei com duas Nikon F4 e usava basicamente 2 lentes, uma 300mm f2.8 auto-foco e 500mm f4 com foco manual.
A foto do Taffarel foi feita com a 300mm e provavelmente com 500 de velocidade e 8 de diafragma. A foto é o negativo cheio, sem cortes.
Fico feliz em estar aqui ao lado de Masao Goto, companheiro dessa jornada e de outras mais.

Claudio Versiani > Jornalista pela Faculdade de Comunicação da Universidade Católica de MG.
Fotógrafo de O Globo (MG), Revista IstoÉ (Belo Horizonte, São Paulo, Brasília) Revista Veja (Brasília) e editor de fotografia do Correio Braziliense (Brasília)
Atualmente é fotógrafo freelance em Nova York, EUA.

Alex Ferro > Carnaval de Rua

Bom, a melhor forma de escrever sobre o ressurgimento do carnaval de rua só mesmo vasculhando a memória e os rascunhos da minha infância. Fui resgatar os momentos mais agradáveis dos meus tempos de moleque. Desde pequeno me sentia fascinado por aqueles personagens enlouquecidos que perambulavam pelas avenidas e ruelas do bairro. Figuras que invadiam o meu imaginário infantil e alimentavam as fantasias de um garoto. As cores das roupas, as máscaras estranhas e quase maléficas, me deixavam magnetizado. Por outro lado, as capas voando e adereços barulhentos me remetiam a uma liberdade não compreendida. O que era aquilo? Que seres eram esses que me deixavam apavorado e ao mesmo tempo, em estado de torpor. O som da bateria dos blocos e o barulho dos instrumentos, a fanfarra metálica das cornetas e das tubas, não surtiam em mim o mesmo efeito de pavor. Aquela música me colocava num lugar de total leveza. Só mais tarde, então, percebi que havia sido tomado, desde pequeno, pela pureza do carnaval. A algazarra produzida por pessoas simples se revelou numa paixão. E como fotógrafo, anos depois, me permiti sentir novamente as mesmas emoções. Hoje, não mais tremendo de medo, mas documentando profissionalmente as minhas lembranças de menino.
Como qualquer garoto nascido no subúrbio (me criei na Ilha do Governador), o carnaval sempre esteve presente na minha vida. Quando criança usava a fantasia que meus pais escolhiam e acreditavam ser perfeitas para mim. Portanto, creiam, já me vestiram de pirata e outras coisas. Mas a roupa de Clóvis era tudo. Parecia um celerado correndo atrás dos mais novos e tacando aquela bola no chão, absolutamente fascinado. Já na fase adolescente, eu não me obrigava mais a vestimentas tão infantis. Então, sempre em parceria com minha mãe, passei a desenhar as roupas que desfilaria pelas ruas. Coitada, ela sofreu com essa minha paixão. Quando carnaval se aproximava, Dona Icléia, não tinha um segundo de paz. Íamos os dois as lojas de tecido à procura pano ideal para a minha invenção. Como bom carnavalesco, eu não podia usar qualquer coisa. Tinha que fazer sucesso! E fazia. As criações por mim inventadas passaram ser copiadas pelos colegas. Era uma farra.
Assim que me tornei fotógrafo – década de 80 – e ingressei na Bloch Editores mais especificamente na revista Manchete, voltei a participar do carnaval. Só que me deparei com uma situação inusitada... Cadê o carnaval de rua? Em 1995 e 96, poucos blocos tinham conseguido resistir bravamente a um espírito maligno anticarnavalesco que chamo até hoje de “Zé Capenga”. Mas a partir de 1999 o carnaval de rua começa a florescer forte. E desde 1998, eu venho documentando o Carnaval de rua.

Carnaval de Rua, 2005, bloco Gigantes da Lira, Laranjeiras, Rio de Janeiro.

E para provar que a festa não morreu, meus caros, escolhi essa foto como testemunha desse renascimento divino e eterno do carnaval de rua.

(O texto contou com a colaboração de Claudia Lopes).


Alex Ferro > Após alguns anos – quase décadas – de música, dividindo minha vida com um piano, caí na fotografia libertadora dos exercícios e mais exercícios técnico-musicais. A vida pianística era de muitos sacrifícios, com fortes dores nos braços e mãos, essa coisa do Piano Mozartiano, Chopiniano, Beethoveniano etc... Não era mole não!
A fotografia caiu em minha vida como uma “asa libertadora”, me aproximando das verdades da vida, vivendo emoções. Reais emoções!
Comecei minha vida de fotógrafo na Universidade Gama Filho, 1989, logo depois ingressando no Jornal O Povo, veículo esse que me deu a imprescíndível frieza fotográfica, tão importante no dia a dia foto-jornalístico.
Saindo do jornal, fiz o sempre muito disputado curso Bloch, ingressando logo depois, 1996, em seu quadro de fotógrafos. Andei por quase todos os títulos dessa editora, de inúmeros ensaios de nu para a Ele&Ela, a horas e mais horas no estúdio, aprendendo. Enfim, no final das contas fui parar na Revista Manchete, o carro chefe da casa. Muitas viagens, matérias diversas. Muito trabalho!
E um deles, como dito no texto principal, o Carnaval, época em que toda a Bloch ficava em polvorosa.

Hoje em dia, participo da agência Pedra Viva (contato@pedraviva.fot.br), responsável em parte por manter a revista Manchete em circulação, através de edições especiais, como a cobertura, todo ano, do Carnaval.

A série A História bem na Foto

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"Depoimentos exemplares":
Antonio Andrade e Campanella Neto
Depoimento do autor:
Aguinaldo Ramos > Brizola pula a fogueira

A História bem na Foto - 2 >
Vera Sayão > Brizola e o Beijoqueiro
Luiz Carlos David > O Papa no Aterro
Renan Cepeda > Polícia no Morro
Juvenal Pereira > JK nos Braços do Povo
Alcyr Cavalcanti > Encontro Cordial entre Desafetos
A História bem na Foto - 3 >
Mabel Arthou > Mais um Domingo...
Antonio Batalha > Tancredo se despede
Silvana Louzada > Collor x general Tinoco
Américo Vermelho > O enterro de D. Lyda
Elisa Ramos > Deficientes físicos: superação
Zeca Guimarães > A dor de Tancredo
Antonio Scorza > Troféu de Guerra
Luciana Whitaker > Bala Perdida
Rogério Reis > O Poeta vira Estátua
Masao Goto Filho > Vitória nos Pênaltis

A História bem na Foto - 5 >
Sergio Araujo > Pulo para a morte
Gilson Barreto > O prédio cai
Walter Firmo > Um santo enternecido
Cristina Zappa > Na alma
Luiz Morier > Todos negros
Américo Vermelho > A bunda da Abertura
Rogério Reis > Vavá encontra Magalhães Pinto
Alcyr Cavalcanti > Sexo na hora, na rua
João Roberto Ripper > Editando Diretas-Já!
Custodio Coimbra > A multidão das Diretas
Ronaldo Theobald > O Deus de calção e chuteira
Georges Racz > O nascimento de uma paixão
Héctor Etchebaster > Homenagem no mar
Januário Garcia > Marcas do tempo
Luiz Carlos David > Asa-delta sobre o Cristo